Category: books

  • Os 6 Melhores Livros Que Li Em 2018

    Foi o ano que mais li. Começou na páscoa quando decidi devotar o feriadão ao projeto de tirar o carro da lama em que patinava há 6 meses. Essa lama era O Tecido do Cosmo de Brian Greene. Ler sobre Física e imaginar o por que de tudo sempre me fascinou. Mas as tantas dimensões dos vários desdobramentos da Teoria das Cordas bloqueou minha fila de leitura por tempo demais. Depois da lama, decidi acelerar com algo que tinha certeza que devoraria, A Segunda Guerra Fria de Luiz Alberto Moniz Bandeira. Excelente, mas não me marcou tanto quanto A Formação do Império Americano, por isso não ganhou uma posição entre os seis aqui embaixo. Embalado, resolvi conhecer a Svetlana, e me apaixonei. A lista, em ordem de leitura.

    O Fim do Homem Soviético – Svetlana Aleksiévitch

    Difícil explicar o fascínio que a coisa soviética imprime em minha mente. Desde sempre me perguntei como as pessoas viviam sob o obscuro (para nós do ocidente) manto da URSS. E as histórias das pessoas é o foco da Svetlana. Sem julgamentos. Esperança. Violência. Amor. O que o ser humano aguenta, como o ser humano aceita, ou não aceita e se pergunta para o resto da vida: o que eu vivi?

    Sapiens – Yuval Noah Harari

    Sapiens, e logo em seguida Homo Deus, justificaram para mim a fama do escritor israelense. A exposição de como nos tornamos estes humanos \”a partir do macaco\” e como obliteramos os obstáculos é um prato cheio para novas perspectivas.

    O Continente – Érico Veríssimo

    Este ano quis encarar alguma grande obra brasileira. A primeira parte de O Tempo e o Vento estava ao alcance e por nada além disso foi escolhido. Desde a primeira folha foi como se estivesse esfomeado num banquete. Deliciando cada novo personagem (e como são muitos!) e vendo reflexos de todas as histórias que ouvia na infância sobre os costumes gaúchos (tão presentes no interior do Paraná no qual cresci). É claro que depois de breves espaços preenchidos por obras curtas como o mangá GEN Pés Descalços e Sobre a Escrita de Stephen King, entre outras, logo engatei O Retrato. Um tempo mais tarde, depois de me decepcionar com o breve Free Will, de Mark Balaguer, sentei para fechar o papo com Érico Veríssimo em O Arquipélago. Os Cambará e os Terra irão para todo sempre comigo.

    Vozes de Tchernóbil – Svetlana Aleksiévitch

    Outro da Svetlana. Chernobil é o futuro, ela fala no começo. Então os relatos. As histórias. O ser humano das esperanças, do horror, da redenção. Não só dos humanos, os bichos também. A luta da pá contra o átomo. O modo de Svetlana deixar as histórias serem contadas por meio da sua obra são incríveis. Escrevi um post sobre o livro, caso te interesse ler mais.

    10 dias que abalaram o mundo – John Reed

    Um relato de um jornalista americano que presenciou a revolução bolchevique da Rússia. Lênin, Trotsky e Stalin e vários outros personagens \”ao vivo\” nos seus discursos e nos corredores do Instituto Smolny. John Reed é o único \”ocidental\” enterrado dentro das muralhas do Kremlin, próximo do túmulo onde estão os restos de Vladimir Ilitch Lênin. Parcial, a favor do comunismo bolchevique, ainda assim não impede de curtir um dos únicos relatos dos poucos dias que mudaram o século da Rússia.

    História Concisa da Rússia – Paul Bushkovitch

    Svetlana apresenta as pessoas comuns. John Reed nos coloca nos dias da revolução. Que atração pela ideia da \”coisa soviética\”, da união das repúblicas. Ideia do comunismo. O que é isso, afinal? O que é a Rússia? A Rússia não é uma ideia. O comunismo não define a Rússia. Paul Bushkovitch retorna ao Rus de Kiev e tece a história desse país do começo. A Igreja Ortodoxa. Os muitos povos. Os mongóis. A Sibéria. A Ucrânia. A Polônia. A Europa. Um povo partido entre seguir o modelo europeu ou o conservadorismo ortodoxo (\”o seu próprio caminho\”). Ivã, o Terrível. Pedro, o Grande. Catarina, a Grande. Autocracia no ápice. E então, a Revolução. E a Grande Guerra Patriótica. E a queda da União Soviética. O tempo tem o poder de colocar os pontos nos i. No caso da Rússia, ou melhor, do meu fascínio pela Rússia, colocar os pontos nos i significa entender o que Bushkovitch quis dizer com \”A Rússia não é uma ideia\”. A Rússia é um país, com uma história num espaço determinado, por um povo, com uma cultura.


    Para o próximo ano eu quero conhecer Tolstói. Mas pretendo abandonar logo os russos para olhar outros brasileiros. Tanto a ficção quanto a história brasileira. Também desejo alimentar a fome de revolução com alguma coisa da francesa, de que nada sei. No meio de um e outro, ler histórias cyberpunk como as do Cory Doctorow, \”nova\” ficção científica como a do Cixin Liu (que publiquem logo a tradução do terceiro tomo!) e também algum quadrinho \”diferente\” como The Art of Charlie Chan Hock Chye, de Sonny Liew. Dificilmente conseguirei ler tanta coisa, mas a intenção aí está.


    Photo by Nikolay Vorobyev on Unsplash

    2018-12-14 21:46:12

  • Voices From Chernobyl 2006

    Svetlana Aleksiévitch\’s books tells only one story. The story of human being in a specific period and region. The Great Patriotic War, the Soviet–Afghan War, the Chernobyl disaster and the fall of Union of Soviet Socialist Republics are just background for the documented speech of common folks smashed by those happenings. By herself:

    …how many novels vanish without a trace! Disappear in the darkness. We haven’t been able to capture the conversational side of human life for literature. (…) I love how humans talk, I love the lone human voice. This is my greatest love and passion.

    First I\’ve read The Last of Soviets (2016). Never I\’ve read something so impactful about human life. Of course I\’m not the most avid reader. But I\’m sure the stories documented by Svetlana are unique. People that saw their loved one disappear and never come back, who went to forced labor fields, who were underneath the constant yoke of an overwhelming power. And yet they found motives to be happy. Like an old man once punished but still lover of soviet socialist utopia. The stories are catchy, Svetlana\’s testimony literature got me in a particular way. It\’s so clear the necessity to register, under all aspects, and never forget, what happened. The war, Stalin, Chernobyl. However, by those witnesses, that were floating in those unaccountable events. Svetlana affirms several times in Voices from Chernobyl how much the russian and ex-USSR republics\’s people seek explanation for those events. If the post-war, post-Stalin and post-Chernobyl\’s life had only one objective: what had happened? In Voices from Chernobyl facts are accessories to human emotions. It opens the curtains. The spouse of a fireman that went to work in the nuclear explosion fire tells about unconditional love, one of terrible consequences. Real lives. Sometimes it doesn\’t feel that, it\’s all so extreme. What humans can do, how can they react. The work\’s subtitle are A Chronicle of the Future (Portuguese version; UK too). We ask ourselves why. Svetlana answers. Chernobyl opened the curtains. Chernobyl isn\’t the past. Is it the future?

    The most fair thing in the world is death. No one can scape it.

    Death turns to be the relief. One case of a child that met a boy in a camp. Then their friends told him she was from Chernobyl. Never again he talked to her. Her dream?

    Now, when I think about the future, I dream with finishing studying and going far away from here, somewhere no one know where I am from. So someone can love me. And I can forget everything.

    Chernobyl is the future.

    I work at the mortuary. This morning, I still haven\’t time to take off my jacket when the door opened and a woman came inside, more than hiccups, she screams: \”Take the medals, with all the certificates. Take the compensations! Give me back my husband\”

    The people beside the nuclear center lived like they were in stone age. The invisible death confused them. They were told to clean everything, to remove a layer of earth, to bury ashes of the wood-burning stove. Some stories are comic:

    You went outside town, and beside the road scarecrows started to appear; a grazing cow covered in plastic and beside it an old lady covered in plastic too. You could\’t choose between laughing or crying.

    The country that put the first man in space fought the atom with a shovel, literally. Thousand were called in urgency  to bury the fourth Chernobyl nuclear reactor\’s guts. Radiation many times beyond the deadly dose. A sarcophagus to bury the potential unspeakable killer. And the chance of a new explosion and the contagious of a larger portion of Europe, and the world.

    …I think so, It\’s the price we pay for the rapid industrialization after the revolution. (…) What our peasant has beyond their hands? Until today! The axe, the scythe, the machete. That\’s all. That\’s the peasant world. Oh, and the shovel too. (…) His conscience oscillate between two epochs, two eras: stone and atomic one.

    And that\’s the man\’s disaster to man. And for the other animals too. Svetlana, it looks, emphasizes what happened to the animals. Earthworms and beetles, revoked and buried. Cats and dogs shot dead by hunting groups ordered to contain everything that could spread radiation. While themselves were dying with radiation doses – curies and roentgen. Other pillars of soviet people stand out too: vodka, literature and the jokes. Vodka was recommended as protection against radiation; literature, always about suffering, born from it, and the jokes…

    Chernobyl jokes. Shortest: \”What a good people were the belarussians\”.

    Before Chernobyl were 82 cases of cancer per 100 thousand inhabitants. After, number went up to 6 thousand. One of five belarussians live in contaminated area. Thousands of tons of cesium, iodine, lead, zirconium, cadmium, beryllium, boron, plutonium; equivalent to 350 bombs like the one dropped in Hiroshima. Voices from Chernobyl register the past to talk about the future. Who is the man? What he is capable of? What is love? Death? Witnesses gain a voice with Svetlana\’s work. They spill over us the reality that no fiction can match. Where are we going after Chernobyl?

    2018-08-15 14:48:51

  • Vozes De Tchernobil Companhia Das Letras 2016

    Os livros de Svetlana Aleksiévitch contam apenas uma história. A história do ser humano em um período e região específicos. A Grande Guerra Patriótica, a Guerra soviética do Afeganistão, o desastre de Chernobil e a queda da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas são apenas pano de fundo para a documentação do discurso de pessoas comuns trituradas por estes acontecimentos. Por ela mesma:

    …quantos romances desaparecem sem deixar rastro no tempo. Permanecem na escuridão. Há uma parte da vida humana, uma conversação que não podemos conquistar para a literatura. (…) Adoro a forma como as pessoas falam, adoro a voz humana solitária. Essa é a minha maior paixão, o meu maior amor.

    Primeiro li O Fim do Homem Soviético (Companhia das Letras – 2017). Jamais tinha lido algo tão impactante sobre vidas humanas. É claro que não sou o mais ávido dos leitores. Mas tenho certeza que os relatos documentados por Svetlana são únicos. Pessoas que viram os seus sumirem e nunca mais voltarem, que foram para campos de trabalho forçado, que estiveram sob o jugo ininterrupto de uma força esmagadora. E que ainda assim encontravam motivos para serem felizes. Como um idoso uma vez punido mas ainda amante da ideia utópica do socialismo soviético. Os relatos são cativantes, a literatura de testemunhos de Svetlana me conquistou de modo único. É tão clara a urgência de se registrar, sob todos os ângulos, e nunca mais esquecer, o que aconteceu. A guerra, Stalin, Chernobil. Porém, sob testemunho daqueles que estiveram boiando nesses oceanos de eventos inexplicáveis. Svetlana afirma em diversas passagens de Vozes de Tchernóbil o quanto o povo russo e dos países da antiga URSS buscam uma explicação para estes eventos. Como se a vida pós-guerra, pós-Stalin e pós-Chernobil só tivesse esse objetivo: o que foi que aconteceu? Em Vozes de Tchernóbil os fatos são coadjuvantes às emoções humanas. Eles apenas abrem a cortina. A mulher do bombeiro que foi apagar o incêndio de uma explosão nuclear conta sobre o amor incondicional, de consequências terríveis. São vidas reais. As vezes não parece, é tudo tão extremo. O que o ser humano pode fazer, como pode reagir. O subtítulo da obra é Crônica do futuro. Nos perguntamos por quê. E Svetlana responde. Chernobil abriu as cortinas. Chernobil não é o passado. Chernobil é o futuro?

    A coisa mais justa do mundo é a morte. Ninguém ainda pode evitá-la.

    O consolo passa a ser a morte. O caso de uma criança que foi para um acampamento e conheceu um garoto. Então os amigos do garoto avisaram que ela era de Chernobil. E nunca mais ele se aproximou dela. Seu sonho?

    Agora, quando penso no meu futuro, eu sonho em terminar a escola e ir embora para bem longe, para um lugar onde ninguém saiba de onde eu sou. Lá alguém poderá me amar. E eu vou poder me esquecer de tudo.

    Chernobil é o futuro.

    Eu presto serviço no comando funerário. Esta manhã, eu ainda não tinha tido tempo de tirar o paletó quando a porta se abriu e entrou uma mulher que, mais que soluçar, gritava: “Fiquem com as medalhas, com todos os diplomas. Fiquem com as compensações! Mas devolvam o meu marido”

    A morte invisível confundia um povo que vivia ao lado do centro nuclear como se estivessem na idade da pedra. Lhes falavam para lavar tudo, remover uma camada de terra, enterrar as cinzas do fogão a lenha. Alguns relatos chegam a ser cômicos:

    Você saia da cidade, e ao longo da estrada surgiam uns espantalhos; via uma vaca pastando coberta por um plástico e ao lado dela uma velha também coberta por plástico. Você não sabia se ria ou se chorava.

    O país que colocou o primeiro homem no espaço combatia o átomo com a pá, literalmente. Milhares foram convocados com urgência para enterrar as entranhas do retor número quatro de Chernobil. Doses de radiação muitas vezes além da dose mortal. A construção de um sarcófago para enterrar o potencial assassino inenarrável. E a possibilidade de uma nova explosão e o contágio de uma porção enorme da Europa, e do mundo.

    … eu penso que sim, que isso é o preço que pagamos pela rápida industrialização depois da revolução. (…) O que o nosso camponês possui além das suas mãos? E até hoje! O machado, a foice, o facão. É tudo. É nisso que o seu mundo se apoia. Ah, e também a pá. (…) A sua consciência oscilava entre dois tempos, entre duas eras: a da pedra e a atômica.

    E assim o desastre do homem para o homem. E também para os outros animais. Svetlana, ao que parece, faz questão de ressaltar o que houve com os bichos. Desde as minhocas e besouros cavados, revirados e enterrados. Até os gatos e cachorros assassinados friamente pelos grupos de caça ordenados para conter tudo o que pudesse espalhar a radiação. Enquanto eles mesmos sorviam medidas de radiação – curies e roentgen. Destacam-se também outros pilares do povo soviético: a vodka, a literatura e as piadas. A vodka, recomendada como proteção contra a radiação; a literatura, sempre falando do sofrimento, nascida dele; e as piadas…

    Anedotas de Tchernóbil. A mais curta: “Que bom povo eram os bielorussos”.

    Eram 82 casos de câncer por 100 mil habitantes antes de Chernobil. Depois o número atingiu 6 mil. Um em cada cinco dos bielorussos vive em área contaminada. Milhares de toneladas de césio, iodo, chumbo, zircônio, cádmio, berílio, boro, plutônio; o equivalente a 350 bombas como a que foi lançada em Hiroshima. Vozes de Tchernóbil registra o passado para falar do futuro. Quem é o homem? Do que é capaz? O que é o amor? A morte? As testemunhas ganham voz através da obra de Svetlana. Nos despejam uma realidade que talvez a ficção não tenha como igualar. Para onde vamos depois de Chernobil?

    2018-07-19 18:28:01

  • Homo Deus Companhia Das Letras 2016

    Yuval Noah Harari é historiador, escreveu Homo Deus como sequência para do seu primeiro best-seller, Sapiens, no qual conta como a espécie Homo Sapiens competiu com outras espécies humanas, dominou o mundo e chegou até o presente. Em Homo Deus, tece uma visão das características do presente para extrapolar as possibilidades para o futuro.

    Humanismo

    Sua tese parte da revolução cognitiva humana, a qual teria nos capacitado a tecer histórias imaginárias compartilhadas por grandes grupos humanos. Desde então, estes grupos foram se tornando mais sofisticados. Na história recente observamos a queda de Deus como principal força motora humana enquanto a \”religião humana\”, o humanismo, toma seu lugar. Dentro do humanismo, três correntes competiram entre si: liberalismo, socialismo e humanismo evolutivo. Com a derrota do nazismo, o humanismo evolutivo perdeu seu principal apostador (Hitler cria na necessidade de intervir e \”salvar\” o processo darwinista de evolução humana para evitar a degradação e consequente extinção da nossa espécie). Com a queda da URSS, o mais forte bastião comunista, o humanismo socialista foi derrotado. A corrente vencedora, humanismo liberalista, venceu com seus supermercados e democracia. No entanto, venceu não por ser mais sagrado ou por fazer os humanos mais felizes. Yuval sugere que essa vitória é produto do processamento distribuído de dados. E que no século XX esta era a forma mais eficiente de desenvolvimento.

    Humanos são processadores de dados

    É só então no fechamento da obra que Yuval nos revela que a busca do humanismo (em especial pela corrente humanista liberal) pela felicidade da sacra vida humana encaminha a espécie para seu possível descarte na lixeira da História. O motivo é que a biologia nos aproxima de uma visão algorítmica da vida. Todos os nossos processos seriam apenas formas de processamento de dados. Sendo o Homo Sapiens o melhor nesta tarefa, prosperou diante de todos os competidores, porém, com o desenvolvimento tecnológico (em especial da inteligência artificial) é possível que estejamos a um passo de tornar nosso processamento de dados orgânico em algo obsoleto. A previsão é ampla mas repleta de exemplos atualíssimos de como a especialização humana não consegue competir com computadores, que já existem, como por exemplo, carros autônomos.

    Livre arbítrio não existe

    Outro ponto de destaque na obra é a questão das nossas \”escolhas\”. A vida como um punhado de algoritmos operando deterministicamente ou probabilisticamente como resposta ao ambiente, destrói o livre arbítrio humano. Somado a isso, as recentes pesquisas de neurociência apontam que não somos um perfeito indivíduo. Existem pelo menos \”dois eus\” com intenções e responsabilidades diferentes operando dentro de nossas cabeças. Homo Deus é um livro fácil de ler e que costura uma grande tese através de  diversas outras menores. Apresenta uma miríade de exemplos históricos que compelem o leitor a puxar o celular e fazer algumas pesquisas no Google para estender o conhecimento. Tantas conexões inéditas são uma fonte fértil para novos insights para aqueles interessados em adivinhações sobre nosso futuro como espécie e em caráter final da pergunta \”o que sou eu?\”.

    2018-05-20 15:58:46

  • Os 6 Melhores Livros Que Li Em 2018 1

    title: “Os 6 melhores livros que li em 2018” category: livros media: 2019/stbasil.jpg

    lang: pt

    Foi o ano que mais li. Começou na páscoa quando decidi devotar o feriadão ao projeto de tirar o carro da lama em que patinava há 6 meses. Essa lama era O Tecido do Cosmo de Brian Greene. Ler sobre Física e imaginar o por que de tudo sempre me fascinou. Mas as tantas dimensões dos vários desdobramentos da Teoria das Cordas bloqueou minha fila de leitura por tempo demais. Depois da lama, decidi acelerar com algo que tinha certeza que devoraria, A Segunda Guerra Fria de Luiz Alberto Moniz Bandeira. Excelente, mas não me marcou tanto quanto A Formação do Império Americano, por isso não ganhou uma posição entre os seis aqui embaixo. Embalado, resolvi conhecer a Svetlana, e me apaixonei. A lista, em ordem de leitura.

    O Fim do Homem Soviético – Svetlana Aleksiévitch

    Difícil explicar o fascínio que a coisa soviética imprime em minha mente. Desde sempre me perguntei como as pessoas viviam sob o obscuro (para nós do ocidente) manto da URSS. E as histórias das pessoas é o foco da Svetlana. Sem julgamentos. Esperança. Violência. Amor. O que o ser humano aguenta, como o ser humano aceita, ou não aceita e se pergunta para o resto da vida: o que eu vivi? Sapiens – Yuval Noah Harari

    Sapiens, e logo em seguida Homo Deus, justificaram para mim a fama do escritor israelense. A exposição de como nos tornamos estes humanos “a partir do macaco” e como obliteramos os obstáculos é um prato cheio para novas perspectivas.

    O Continente – Érico Veríssimo

    Este ano quis encarar alguma grande obra brasileira. A primeira parte de O Tempo e o Vento estava ao alcance e por nada além disso foi escolhido. Desde a primeira folha foi como se estivesse esfomeado num banquete. Deliciando cada novo personagem (e como são muitos!) e vendo reflexos de todas as histórias que ouvia na infância sobre os costumes gaúchos (tão presentes no interior do Paraná no qual cresci). É claro que depois de breves espaços preenchidos por obras curtas como o mangá GEN Pés Descalços e Sobre a Escrita de Stephen King, entre outras, logo engatei O Retrato. Um tempo mais tarde, depois de me decepcionar com o breve Free Will, de Mark Balaguer, sentei para fechar o papo com Érico Veríssimo em O Arquipélago. Os Cambará e os Terra irão para todo sempre comigo.

    Vozes de Tchernóbil – Svetlana Aleksiévitch

    Outro da Svetlana. Chernobil é o futuro, ela fala no começo. Então os relatos. As histórias. O ser humano das esperanças, do horror, da redenção. Não só dos humanos, os bichos também. A luta da pá contra o átomo. O modo de Svetlana deixar as histórias serem contadas por meio da sua obra são incríveis. Escrevi um post sobre o livro, caso te interesse ler mais.

    10 dias que abalaram o mundo – John Reed

    Um relato de um jornalista americano que presenciou a revolução bolchevique da Rússia. Lênin, Trotsky e Stalin e vários outros personagens “ao vivo” nos seus discursos e nos corredores do Instituto Smolny. John Reed é o único “ocidental” enterrado dentro das muralhas do Kremlin, próximo do túmulo onde estão os restos de Vladimir Ilitch Lênin. Parcial, a favor do comunismo bolchevique, ainda assim não impede de curtir um dos únicos relatos dos poucos dias que mudaram o século da Rússia.

    História Concisa da Rússia – Paul Bushkovitch

    Svetlana apresenta as pessoas comuns. John Reed nos coloca nos dias da revolução. Que atração pela ideia da “coisa soviética”, da união das repúblicas. Ideia do comunismo. O que é isso, afinal? O que é a Rússia? A Rússia não é uma ideia. O comunismo não define a Rússia. Paul Bushkovitch retorna ao Rus de Kiev e tece a história desse país do começo. A Igreja Ortodoxa. Os muitos povos. Os mongóis. A Sibéria. A Ucrânia. A Polônia. A Europa. Um povo partido entre seguir o modelo europeu ou o conservadorismo ortodoxo (“o seu próprio caminho”). Ivã, o Terrível. Pedro, o Grande. Catarina, a Grande. Autocracia no ápice. E então, a Revolução. E a Grande Guerra Patriótica. E a queda da União Soviética. O tempo tem o poder de colocar os pontos nos i. No caso da Rússia, ou melhor, do meu fascínio pela Rússia, colocar os pontos nos i significa entender o que Bushkovitch quis dizer com “A Rússia não é uma ideia”. A Rússia é um país, com uma história num espaço determinado, por um povo, com uma cultura. Para o próximo ano eu quero conhecer Tolstói. Mas pretendo abandonar logo os russos para olhar outros brasileiros. Tanto a ficção quanto a história brasileira. Também desejo alimentar a fome de revolução com alguma coisa da francesa, de que nada sei. No meio de um e outro, ler histórias cyberpunk como as do Cory Doctorow, “nova” ficção científica como a do Cixin Liu (que publiquem logo a tradução do terceiro tomo!) e também algum quadrinho “diferente” como The Art of Charlie Chan Hock Chye, de Sonny Liew. Dificilmente conseguirei ler tanta coisa, mas a intenção aí está.

    Photo by Nikolay Vorobyev on Unsplash

  • Voices From Chernobyl 2006 1

    title: “Voices from Chernobyl – 2006” category: books media: 2018/vozes-de-tchernobil-capa-livro.jpg

    lang: en

    Svetlana Aleksiévitch’s books tells only one story. The story of human being in a specific period and region. The Great Patriotic War, the Soviet–Afghan War, the Chernobyl disaster and the fall of Union of Soviet Socialist Republics are just background for the documented speech of common folks smashed by those happenings. By herself:

    …how many novels vanish without a trace! Disappear in the darkness. We haven’t been able to capture the conversational side of human life for literature. (…) I love how humans talk, I love the lone human voice. This is my greatest love and passion.

    First I’ve read The Last of Soviets (2016). Never I’ve read something so impactful about human life. Of course I’m not the most avid reader. But I’m sure the stories documented by Svetlana are unique. People that saw their loved one disappear and never come back, who went to forced labor fields, who were underneath the constant yoke of an overwhelming power. And yet they found motives to be happy. Like an old man once punished but still lover of soviet socialist utopia.

    The stories are catchy, Svetlana’s testimony literature got me in a particular way. It’s so clear the necessity to register, under all aspects, and never forget, what happened. The war, Stalin, Chernobyl. However, by those witnesses, that were floating in those unaccountable events. Svetlana affirms several times in Voices from Chernobyl how much the russian and ex-USSR republics’s people seek explanation for those events. If the post-war, post-Stalin and post-Chernobyl’s life had only one objective: what had happened?

    In Voices from Chernobyl facts are accessories to human emotions. It opens the curtains. The spouse of a fireman that went to work in the nuclear explosion fire tells about unconditional love, one of terrible consequences. Real lives. Sometimes it doesn’t feel that, it’s all so extreme. What humans can do, how can they react.

    The work’s subtitle are A Chronicle of the Future (Portuguese version; UK too). We ask ourselves why. Svetlana answers. Chernobyl opened the curtains. Chernobyl isn’t the past. Is it the future?

    The most fair thing in the world is death. No one can scape it.

    Death turns to be the relief. One case of a child that met a boy in a camp. Then their friends told him she was from Chernobyl. Never again he talked to her. Her dream?

    Now, when I think about the future, I dream with finishing studying and going far away from here, somewhere no one know where I am from. So someone can love me. And I can forget everything.

    Chernobyl is the future.

    I work at the mortuary. This morning, I still haven’t time to take off my jacket when the door opened and a woman came inside, more than hiccups, she screams: “Take the medals, with all the certificates. Take the compensations! Give me back my husband”

    The people beside the nuclear center lived like they were in stone age. The invisible death confused them. They were told to clean everything, to remove a layer of earth, to bury ashes of the wood-burning stove. Some stories are comic:

    You went outside town, and beside the road scarecrows started to appear; a grazing cow covered in plastic and beside it an old lady covered in plastic too. You could’t choose between laughing or crying.

    The country that put the first man in space fought the atom with a shovel, literally. Thousand were called in urgency to bury the fourth Chernobyl nuclear reactor’s guts. Radiation many times beyond the deadly dose. A sarcophagus to bury the potential unspeakable killer. And the chance of a new explosion and the contagious of a larger portion of Europe, and the world.

    …I think so, It’s the price we pay for the rapid industrialization after the revolution. (…) What our peasant has beyond their hands? Until today! The axe, the scythe, the machete. That’s all. That’s the peasant world. Oh, and the shovel too. (…) His conscience oscillate between two epochs, two eras: stone and atomic one.

    And that’s the man’s disaster to man. And for the other animals too. Svetlana, it looks, emphasizes what happened to the animals. Earthworms and beetles, revoked and buried. Cats and dogs shot dead by hunting groups ordered to contain everything that could spread radiation. While themselves were dying with radiation doses – curies and roentgen.

    Other pillars of soviet people stand out too: vodka, literature and the jokes. Vodka was recommended as protection against radiation; literature, always about suffering, born from it, and the jokes…

    Chernobyl jokes. Shortest: “What a good people were the belarussians”.

    Before Chernobyl were 82 cases of cancer per 100 thousand inhabitants. After, number went up to 6 thousand. One of five belarussians live in contaminated area. Thousands of tons of cesium, iodine, lead, zirconium, cadmium, beryllium, boron, plutonium; equivalent to 350 bombs like the one dropped in Hiroshima.

    Voices from Chernobyl register the past to talk about the future. Who is the man? What he is capable of? What is love? Death? Witnesses gain a voice with Svetlana’s work. They spill over us the reality that no fiction can match. Where are we going after Chernobyl?